sábado, 5 de março de 2011

Sem hospital ou faculdade, cidade de MG cresce com ferro de Brucutu


Com reservas de 650 milhões de toneladas, Brucutu é a 2ª maior mina do país (Foto: Darlan Alvarenga/G1)

Arrecadação de São Gonçalo do Rio Abaixo cresceu 45% em 2010.Mina é a 2ª do país e produz cerca de 30 milhões de toneladas por ano.

A pequena São Gonçalo do Rio Abaixo (MG), cidade de apenas 9.782 habitantes, de acordo com os dados do Censo 2010, localizada a 84 km de Belo Horizonte, não sabe o que é desemprego nem cortes no orçamento. Com uma receita que cresceu 45% em 2010, o município se transformou num imenso canteiro de obras e vive uma fase de ouro. Ou melhor, de ferro. A indústria extrativa foi o destaque do PIB em 2010, com alta de 15,7%.
Destaque do PIB em 2010, o minério de ferro tem promovido uma revolução econômica no município, onde está localizada a mina de Brucutu, a segunda maior do país, com reservas de mais de 650 milhões de toneladas, atrás apenas de Carajás, no Pará. O número de empregos diretos e indiretos gerados na cidade chega a 400.
Inaugurada em outubro de 2006, o projeto da Vale fez triplicar o orçamento de São Gonçalo do Rio Abaixo. Beneficiada pelos royalties da mineração, a arrecadação do município subiu de R$ 33,8 milhões, em 2006, para R$ 94,5 milhões, em 2010. Pela legislação, 2% do faturamento líquido da exploração de minério de ferro é recolhido a título da Compensação Financeira pela Exploração dos Recursos Minerais (CFEM), contribuição distribuída entre cidades, estados e União.
De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a cidade representava em 2008 o 3º maior Produto Interno Bruto (PIB) per capita de Minas Gerais. A renda média anual de cada morador de São Gonçalo chegou a R$ 88.037,11. Na capital do estado, a renda em 2008 foi de R$ 17.313,06.“Para quem quer trabalhar, não tem desemprego aqui não”, afirma o prefeito Raimundo Nonato Barcelos, conhecido como Nozinho. Com os cofres cheios, a prefeitura tem feito obras e construído instalações arrojadas para um município pequeno e que foi emancipado há apenas 48 anos.O Centro Cultural inaugurado em 2007 é o novo cartão-postal da cidade. O prédio de vidros espelhados reúne um auditório para 300 pessoas, salas para oficinas, espaço para exposições, biblioteca e um laboratório com acesso grátis à internet.
A prefeitura inaugurou também uma escola de tempo integral com ginásio e auditório, iniciou o tratamento de água e esgoto, abriu novos loteamentos e estradas e acaba de anunciar um plano de investimentos de R$ 64 milhões para os próximos 2 anos, que prevê a construção de uma escola de tempo integral na zona rural, uma praça de eventos, um estádio e o primeiro hospital do município, com 30 leitos.Em alguns casos, o município também tem assumido responsabilidades do governo estadual. As reformas da sede da polícia militar da cidade e do prédio da escola estadual, por exemplo, foram bancadas pela administração municipal. A prefeitura decidiu até contratar um advogado para oferecer aos moradores o serviço de defensoria pública, que não existia na região. “Não é que está sobrando [dinheiro]. Estamos fazendo bom uso do dinheiro público”, diz o prefeito.

Centro Cultural é o novo cartão postal de São Gonçalo do Rio Abaixo (Foto: Darlan Alvarenga/G1)

No rastro da Vale, São Gonçalo ganhou uma unidade do Senai, com 450 vagas. Segundo a prefeitura, o crescimento econômico tem aumentado o interesse por educação. O número de matriculados na rede municipal subiu de 691, em 2005, para 2.474, em 2010. “Hoje temos mais de 4 mil estudantes no município”, diz Nozinho.A prefeitura negocia agora a vinda de uma unidade da Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG), para oferecer à população uma opção local de ensino superior. A cidade chegou a ter uma faculdade particular por dois anos, mas em 2009 os cursos foram transferidos para Itabira.


Daniel de Oliveira foi recrutado pela Vale quando se matriculou no ensino técnico (Foto: Darlan Alvarenga/G1)

Jovens são recrutados no ensino técnico
Dos cerca de 1.600 funcionários próprios da mina de Brucutu, 150 são moradores de São Gonçalo. O número só não é maior por falta de mão de obra qualificada. O mecânico Daniel de Oliveira, de 22 anos, conta que foi recrutado no momento em que se matriculou no curso técnico.
“Decidi trancar a faculdade de engenharia ambiental porque vi uma oportunidade de crescimento profissional imediata no quintal de casa. Agora sou um estudante com profissão e salário”, diz o jovem que integra a turma de 58 trainees que atuam hoje em Brucutu.Na oficina da mina, Daniel atua na manutenção de máquinas cujo pneu chega a ter 2,7 m de altura. “Foi amor à primeira vista. Ver pessoalmente uma máquina assim é muito impactante", diz o aprendiz, que pretende agora investir na carreira de engenheiro mecânico.

A abertura da mina atraiu também moradores de outras cidades. O operador de escavadeira, Anivaldo Nunes dos Santos, de 45 anos, veio de Sabará (MG) e conseguiu um emprego para o filho no setor de perfuração. “Minha irmã fala que vai fazer um curso de elétrica para também entrar na Vale”, diz Maycon Alves dos Santos, de 22 anos.
Pai e filho são hoje parceiros de trabalho e de sala de aula. Maycon convenceu o pai a entrar junto na faculdade de Logística. Mas como não há faculdade em São Gonçalo, os dois estudam na cidade vizinha João Monlevade. “Tem várias provas doidas, mas temos que aproveitar as oportunidades para crescer na empresa”, diz.
A assistente administrativa, Gleiciele Araújo, de 28 anos, recorda que o seu primeiro emprego em Brucutu foi como auxiliar de produção. “Era serviço de peão, com luva e capacete”, diz. Hoje, é dela o maior salário da família. “Meu marido não gosta de ouvir isso, mas é verdade”.
Moradora da cidade há 19 anos, Gleiciele diz que São Gonçalo é outra hoje. “Mudou praticamente tudo. Não tinha nada aqui”, diz. Ela só reclama de ainda ter que sair da cidade para poder cursar uma faculdade ou buscar atendimento médico especializado.
Como ainda não há hospital ou maternidade no município, os moradores precisam ir até outra cidade para ter um filho. "A gente brinca que ninguém nasce em São Gonçalo, mas acho que isso vai mudar", diz Gleiciele.

Por dentro da mina
Escondida atrás das montanhas que cercam a área urbana de São Gonçalo do Rio Abaixo, com estradas exclusivas para o acesso ao complexo, a mina parece uma cidade a parte.


Produção de Brucutu é destinada 100% para exportação (Foto: Darlan Alvarenga/G1)

Ao todo, a Vale investiu US$ 1,1 bilhão em Brucutu. No total, foram gerados cerca de 8.500 empregos pelo Complexo Minas Centrais na região, incluindo os municípios de Barão de Cocais, Itabira, João Monlecade e Santa Bárbara. Hoje, trabalham na mina cerca de 2.500 pessoas, entre empregados próprios e contratados.
A mina é a maior do mundo em capacidade inicial de produção: 30 milhões de toneladas por ano, volume atingido pela primeira vez em 2010, quatro anos depois da inauguração do complexo. Em 2006, a produção inicial foi de 7,75 milhões de t.
“A Mina de Brucutu produz cerca de 30 milhões de toneladas por ano e responde sozinha por 10% da produção total de minério de ferro da Vale no Brasil”, afirma Júlio Yamacita, gerente geral do Complexo Minas Centrais, que conta ainda com as minas de Gongo Soco e Água Limpa. Em Brucutu tudo é gigantesco, começando pela área de extração: são 3,5 milhões de metros quadrados licenciados, o equivalente a 17 estádios como o Mineirão, em Belo Horizonte (MG).A cava de perfuração possui 2,5 km de comprimento e mais de 150 m de altura. Vista do alto, a cratera parece mais um cenário cinematográfico de exploração fora da Terra. A impressão é de estar num planeta cinza e vermelho. “Aqui só há duas estações: lama e poeira”, brinca um técnico.Todas as ordens para a área operacional de Brucutu partem da sala de comando, que recebe imagens de 37 câmeras, com visão de 360 graus e alcance de 1.500 metros de distância, espalhadas pelo complexo.


Minério extraído em Brucutu é levado diretamente para o Porto de Tubarão, no ES (Foto: Darlan Alvarenga/G1)

A usina de concentração de minério e o carregamento ferroviário são totalmente automatizados. Embora não seja tóxico, em nenhuma das fases da extração os trabalhadores entram em contato direto com o ferro.A mina funciona 24h por dia, em três turnos de trabalho, para garantir o abastecimento das locomotivas partem da mina diretamente para o Porto de Tubarão, em Vitória (ES). Cada vagão leva em média um minuto para ser carregado. Por dia, são abastecidos cerca de 2 mil vagões, com capacidade média de 80 t cada um.A produção de Brucutu é destinada 100% para exportação. O principal destino é a China, que em 2010 recebeu 48% da exportação de minério de ferro do Brasil, segundo dados do Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração).
Os equipamentos utilizados para transportar o minério são de dimensões colossais. O que mais impressiona é o chamado caminhão fora de estrada, com 8m de altura e de largura. Ao todo, são 16, com capacidade para transportar até 240 toneladas de minério. O preço de uma máquina dessas gira em torno de US$ 3 milhões.
Brucutu é uma das minas de maior concentração de ferro e, portanto, de maior lucratividade da Vale. De cada 5 caminhões que são carregados dentro da cava, 3 são de minério de ferro e dois são de material estéril, sem valor comercial.
“Temos que tirar pouco material para poder tirar o minério em si e isso faz com que a mina tenha um custo muito baixo e uma alta produtividade”, diz Yamacita. “Brucutu já está operando na sua capacidade máxima e agenta pelo menos mais 25 anos nesse ritmo de produção".Como a Vale detém na Serra de Brucutu muita área ainda não licenciada para exploração, Brucutu ainda pode trazer boas surpresas para a população da região. "Se tiver demanda, vamos buscar alternativas para a produção se manter nesse patamar”, afirma o gerente da mina.
Fonte: Darlan Alvarenga Do G1, em São Gonçalo do Rio Abaixo (MG)

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